domingo, 8 de novembro de 2009

Estágio Final

Quando eu era bem pequeno - isso já faz um bom tempo - a minha mãe costumava dizer nas suas humildes reflexões a seguinte frase: "Ai, ai morais, quem morre não vem cá mais". Na minha tenra idade, de limitada compreensão, eu me arrepiava todo e procurava me esconder pra não pensar, muito menos tentar compreender o significado daquelas palavras tão sombrias e assustadoramente despropositais para a ocasião. Aquilo me dava um medo terrível da morte e, ao mesmo tempo me despertava uma curiosidade amedrontada de querer descobrir como era essa coisa de "não voltar mais". Eu simplesmente não aceitava o fato de não poder voltar mais pra aquela minha vidinha de menino simples, de uma cidade simples, do interior da Bahia.
Era como se, a partir daquele momento, eu já me sentisse morto. Me dava mesmo muito medo.
Justificar
Hoje, quase meio século depois de ouvir aquela frase pela primeira vez, seguida de tantas outras repetições, e depois da fatídica profecia ter atingido minha velha mãe, eu ainda não consegui definir com certeza um conceito concreto a respeito da morte. São tantos os pensamentos, crenças, filosofias, que o medo já não existe mais, porém a curiosidade ainda permanece, talvez ainda maior diante de tanta informação controversa.

O fato é que, após passado aquele trauma inicial da infância, eu nunca mais pensei nisso e até perdi o medo da morte e vivi bem com a consciência de que este é mesmo o destino imutável de todos, afinal somos nós mortais.

Só agora, pouco tempo após ter ultrapassado a barreira do meio século, que chegou assim, sem mais nem menos, de repente, sem nenhum aviso prévio, voltei a pensar no assunto e observar mais a velhice e a possibilidade de não estar mais aqui pra ver a copa do mundo de 2050, por exemplo. De não ver as ações globais para a solução da poluição em,.... Deus sabe quando!... Com certeza ainda está bem longe de acontecer.

Em algum lugar eu li que "podemos considerar a morte como a maior das crises que o homem enfrenta". Eu, particularmente discordo, até porque a morte não vejo a morte como uma crise, e sim como um fato único, consumado. Só dá uma vez e pronto. Fim. The end, C'est fini. Finito. Acabou. Game over. Não tem mais vida.

A questão que mais me faz refletir a partir de agora, vendo a morte por um ângulo de causa natural, é que a partir de um determinado momento da vida as perdas se aceleram mesmo e o tempo para recuperá-las é bem menor. A debilidade é irreversível e o ponto final é final mesmo.

Não tenho mais medo da morte, mas apenas me pego imaginando que não estarei mais aqui a partir de um determinado momento e não terei a oportunidade de ver e participar de tantas coisas que ainda gostaria de presenciar. Isso pode deprimir. Cuidado!

Esta é a verdadeira crise, não a da morte, mas a da pré-morte, que chega assim de repente, a partir de um certo estágio da vida, e não tem prazo de validade definido. Só termina quando começa o estágio final, a morte, que também não tem data marcada. Simplesmente "passa".

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